ALAN TATOO
NA PELE PARA SEMPRE
EDUARDO BASTOS
Tatuagem
Chico Buarque
Quero ficar no teu corpo
Feito tatuagem
Que é pra te dar coragem
Pra seguir viagem
Quando a noite vem
As tatuagens são uma forma de arte corporal que atrai milhares de pessoas em todo o mundo. Curiosamente, ostentar uma tatuagem faz com que uma pessoa pareça moderna, entretanto, esta arte já existe há séculos. A forma como é feita foi modernizada, mas a essência de ornamentar o corpo com desenhos já existe há muito tempo. Os tipos de desenhos são muito variados e encontrados para todos os gostos. Além disso, quem tem talento para desenhar pode criar algo exclusivo e personalizado ou pedir que um tatuador o faça. Assim como há variação de desenhos, seus significados também podem variar bastante. O significado de uma tatuagem é algo bastante relativo, já que algumas pessoas se preocupam com o que a imagem representa, com o significado do desenho e o escolhem de acordo com o que pretendem representar, enquanto outras fazem a tatuagem apenas por sua beleza.
ALAN CLEITON
Por umas duas vezes, e sempre nas tardes de sábados, Ademir me chamava para irmos à casa de Alan, onde os dois travavam uma peleja ferrenha ao longo de três ou quatro horas, disputando de duas a, no máximo, três partidas - pois não podíamos sair dali com o jogo empatado.

QUEM É O TATUADOR A QUEM ME REFIRO
Alan Cleiton Fagundes é um lagartense, filho de um taxista e uma costureira, que na adolescência residiu por um bom tempo no Povoado Barro Vermelho. No início da década de 1990, ele voltou a morar na cidade, e ai estudou na Escola Frei Cristóvão de Santo Hilário, no Colégio Cenecista Laudelino Freire, e no Aberlardo Romero Dantas, de onde saiu quando cursava o segundo ano, pois se viu impossibilitado de concluir os estudos, uma vez que já havia constituído família, tinha filho, e labutava ao longo do dia em dois empregos - além de tatuador, Alan é alinhador e balanceador de automóveis.



Os materiais que o tatuador usa em sua atividade costumam mudar através dos anos. Alan disse que, no começo, a máquina que usava era caseira e a tinta também era grotesca - ainda se usava nanquim, que não é uma tinta apropriada para tatuagem, mas que não dava problema, dificilmente se via uma alergia numa pessoa. Em 2002, Alan comprou seu material, seu primeiro kit - um kit básico, que ele adquiriu nas Lojas Tatoo, e que continha uma tinta homogênea e importada. Hoje, a tinta que Alan usa é a Elektrika, um produto antialérgico e liberado pela Anvisa. Em relação a agulhas, nosso tatuador diz que a maioria das que usa é importada; outras são nacionais, mas de boa qualidade.
O ato de tatuar envolve grande risco de infecção, dependendo do tatuador e do cliente. O cliente tem sempre que ter a preocupação de procurar um bom profissional, aquele que sempre usa um material correto, haja vista que uma contaminação pode se dá tanto pela agulha, quanto por um borrifador, a depender da experiência e dos cuidados adotados pelo tatuador durante a execução do seu trabalho.
Durante muito tempo a tatuagem foi encarada de forma preconceituosa, a ponto de um sujeito tatuado ter dificuldade até mesmo para ser aceito num emprego. Alan diz que hoje esse preconceito diminuiu muito, que é grande o número de pessoas tatuadas, e que tem até mesmo lojas de moda, em cidades como o Rio de Janeiro, que só contratam funcionários se eles ou elas tiverem tatuagens ou piercings.
Noventa e oito por cento dos clientes que procuram o studio de Alan já chegam lá com o desenho, ou com a ideia do que querem ver tatuado em suas peles. Alan diz que só influencia na escolha do cliente se o desenho se referir a seitas, nome de namorado(a), de parentes, de pessoas, de artistas ou de times de futebol.
A tatuagem que deu mais trabalho a Alan foi a de um cliente de nome Gilvando. Ele pediu que Alan fizesse um dragão em suas costas, depois disse que queria um tigre do lado, em seguida disse que desejava umas letras japonesas e uma flor de lótos. Em outro momento, esse mesmo cliente resolveu que queria mais letras japonesas, mais flor de lótos e nomes. Alan diz que acabou levando dois anos para fechar as costas de Gilvando com tatuagens, mas que foi um dos trabalhos que mais gostou de fazer.
Uma série de motivos lavam as pessoas a desistir de fazer um tatuagem. Alan disse que já teve situações em que ele preparou material, bancada e tudo, e quando chegou com a agulha a cliente desistiu. Alguns tatuadores cobram por essa desistência em cima da hora, uma vez que grande parte do material se perde. Depois que o tatuador coloca a tinta no pote, ela tem que ser descartada, mesmo que uma gota sequer tenha sido usada. O mesmo acontece com a vaselina e a agulha que foi aberta. Durante os anos em que trabalho de tatuagem, dois clientes de Alan acabaram desistindo de concluir a pintura: um que era tatuado na costela; outro na cintura.
Hoje, Alan é também campeão do jogo xadrez em Lagarto. Ele diz que jogar xadrez ajuda muito em seu trabalho como tatuador. Xadrez ajuda em seu desenvolvimento mental, ajuda a tatuar, ajuda no trato com as pessoas e ajuda ainda a ele ser paciente.
A internet é uma ferramenta fundamental, da qual Alan faz uso tanto para pesquisar, quanto para aprimorar sua técnica. Ele diz que hoje o Youtube ajuda muito no seu aprendizado. Um dos tatuadores que ele Admira é Anil Gupta. Alan diz que, graças ao Youtube, hoje ele pode ter Gupta ali na tela do seu computador trabalhando - e isso contribui para que ele aprenda ainda mais e aprimore sua técnica.
Alan revela que o valor de um tatuagem costuma ser definido pelo do tempo gasto ou pelos centímetros quadrados tomados pelo desenho na pele do cliente. Desde que começou, Alan trabalha por centímetro quadrado, pelo espaço tatuado; outros tatuadores trabalham por tempo. Alan diz que é possível viver da profissão. Se o tatuador for um bom profissional, é possível ter um retorno financeiro. Alan confessa que nunca trabalhou por dinheiro, mas sim por gostar de desenhar, e esclarece que visa sempre fazer o que gosta - e o que ele gosta de fazer na vida é tatuar.
A TATUAGEM DE CADA UM
Thais Santos

Originário das tradições Celtas, ele representa as três faces da Grande Mãe, a energia criadora do universo, cujas três faces são a Virgem, a Mãe e a Anciã. Muito utilizado também como símbolo de proteção:
Minha segunda tatuagem, uma Catrina:
Um esqueleto de uma mulher completamente adornada, como distintivo da alta sociedade do início do século XX e tem uma função de lembrar que as diferenças sociais não significam nada diante da morte. A origem da Catrina remonta às festas dos mortos pré-colombianas.
Minha terceira tatuagem fiz aqui na cidade de
Lagarto com o tatuador Iuri Valença, uma âncora que fiz junto com uma amiga
minha, como forma de simbolizar a nossa amizade:
Minha quarta tatuagem foi com o tatuador Zabdiel
Neri. Meu poema favorito do meu escritor favorito: Charles Bukowski. Poema
Bluebird:
Pássaro Azul
Há um pássaro azul em meu peito
que quer sair
mas sou duro demais com ele,
eu digo, fique aí, não deixarei que ninguém o veja.
há um pássaro azul em meu peito que
quer sair
mas eu despejo uísque sobre ele e inalo
fumaça de cigarro
e as putas e os atendentes dos bares
e das mercearias
nunca saberão que
ele está
lá dentro.
há um pássaro azul em meu peito
que quer sair
mas sou duro demais com ele,
eu digo,
fique aí,
quer acabar comigo?
que quer sair
mas sou duro demais com ele,
eu digo, fique aí, não deixarei que ninguém o veja.
há um pássaro azul em meu peito que
quer sair
mas eu despejo uísque sobre ele e inalo
fumaça de cigarro
e as putas e os atendentes dos bares
e das mercearias
nunca saberão que
ele está
lá dentro.
há um pássaro azul em meu peito
que quer sair
mas sou duro demais com ele,
eu digo,
fique aí,
quer acabar comigo?
Quer foder o meu trabalho?
Quer arruinar minha venda de livros na Europa?
Há um pássaro azul em meu peito que
quer sair
mas sou bastante esperto, deixo que ele saia somente em algumas noites
quando todos estão dormindo.
eu digo: sei que você está aí,
então não fique triste.
Depois, o coloco de volta em seu lugar,
mas ele ainda canta um pouquinho
lá dentro, não deixo que morra completamente
e nós dormimos juntos
assim com o nosso pacto secreto
e isto é bom o suficiente para
fazer um homem
chorar,
mas eu não choro,
e você?
quer sair
mas sou bastante esperto, deixo que ele saia somente em algumas noites
quando todos estão dormindo.
eu digo: sei que você está aí,
então não fique triste.
Depois, o coloco de volta em seu lugar,
mas ele ainda canta um pouquinho
lá dentro, não deixo que morra completamente
e nós dormimos juntos
assim com o nosso pacto secreto
e isto é bom o suficiente para
fazer um homem
chorar,
mas eu não choro,
e você?
A tatuagem mais recente
que fiz é uma árvore, a mãe e o filho, que ao mesmo tempo que representa a
grande mãe terra que nos dá a vida, representa a mim e a meu filho. O triângulo
invertido representa o meu elemento: água. A fusão Terra x Água. A vida que se
forma e transforma.
Rodrigo Bomfim
Rodrigo Bomfim é funcionário público e diz que sua tatuagem representa algo muito significativo, tão importante que ele decidiu carrega-la numa parte do seu corpo. Ele resolveu faze-la porque queria deixar registrado algo que foi importante durante um período de sua vida. A tatuagem de Rodrigo representa sua personalidade, trás algo de muito importante para ele. Rodrigo sente que ainda há muito preconceito em relação à tatuagem, e que alguns religiosos se utilizam dos livros para fundamentarem suas opiniões. O que essas pessoas não percebem, segundo Rodrigo, é que a tatuagem, na maioria dos casos, encerra apenas um significado próprio.
Isadora Fernanda de Freitas Cunha
Isadora Fernanda de Freitas Cunha
A jovem loira e simpática de nome Isadora Fernanda de Freitas Cunha nasceu e se criou na cidade de Itabaiana (SE), e fez seu ensino médio nessa cidade mesmo, no Colégio Opção. Atualmente Isadora é aluna do curso de Terapia Ocupacional da Universidade Federal de Sergipe, no Campus de Lagarto. Isadora decidiu-se por esse curso quando necessitou frequentar uma clinica por um tempo para acompanhar o tratamento de reabilitação de sua genitora. Na busca por um curso que garantisse seu ingresso na Universidade, Isadora acabou por se decidir por Terapia Ocupacional, mesmo não sabendo ao certo as exigências, o que se fazia no curso e se era isso mesmo o que ela queria fazer. Depois ela passou a gostar do curso.
Isadora resolveu fazer sua primeira tatuagem porque desde que era criança achava bonito. Duas de suas tias têm tatuagem, assim como um dos seus tios. Sua mãe sempre dizia que nunca deixaria ela fazer, mas Isadora sempre lhe falava que quando fosse independente faria sim uma tatuagem. Um dia, há cerca de dois anos, Isadora chegou para sua mãe e disse que estava decidida a tatuar sua pele. Sua mão tentou dissuadir Isadora da ideia, mas acabou tendo que aceitar.
A primeira tatuagem de Isadora Fernanda é a imagem de uma gaiola, uma chave largada ao lado, alguns pássaros ganhando a liberdade e a inscrição "Believe". Até se decidir por essa tatuagem, Isadora pesquisou e viu muitas fotos na rede mundial de computadores. No início ela tinha em mente umas oito opções de tatuagens, mas ai se deparou com essa imagem, achou a palavra Believe muito forte e finalmente decidiu-se por imprimir esse que é o desenho que há dois anos ela mostra no seu antebraço direito.
Em agosto de 2015, Isadora voltou a tatuar sua pele. Dessa vez o local escolhido foi a coxa da perna direita, e ali ela fez imprimir a frase "Recomeçar Faz Parte de Viver". Ela escolheu essa frase por sempre gostar, por se identificar com ela, por ela fazer parte até do seu status do watsapp. Quando Isadora pensou em fazer sua segunda tatuagem, nunca passou por sua mente que seria uma frase. Mas esse acabou sendo o desenho escolhido, e ela se decidiu por tatuá-lo em sua perna porque achava bonito tatuagens que tinha visto em outras pessoas, especificamente nesse local.
Na sua família, os parentes maternos acharam a tatuagem de Isadora legal, não opinaram muito. Já sua avó, mãe de seu pai, quando viu sua primeira tatuagem disse que aquilo era coisa de malandro, de maconheiro e de vagabundo. Isadora falou para sua avó que tatuagem não desvia a personalidade de ninguém, e ai sua avó acabou por aceitar. Mas Isadora confessa que até hoje sua mão diz que sente vergonha quando a filha levanta o braço. A mãe de Isadora não gosta. Admite que até acha bonito tatuagem, mas apenas as que são feitas nos outros. Por ela, Isadora não teria feito nenhuma tatuagem. Ela chegou até mesmo a dizer à filha: "Eu deixo você fazer, mas saiba que não é de minha vontade!?". Toda vez que Isadora diz que vai fazer uma nova tatuagem, sua genitora começa a dizer: "Você sabe que quando for arrumar um emprego as pessoas irão olhar isso, que você tem tatuagem..." Diante dessa fala, Isadora diz que tenta convencer à mãe que não é tão simples assim, e ai ela entende.
Isadora diz que o preconceito em relação a quem tem tatuagem ainda é algo muito forte na sociedade. Mas ele diz também que esse preconceito diminuiu muito, e acha que isso se deve ao fato de a tatuagem ter virado moda, de quase todo mundo estar querendo se tatuar. Isadora diz que as pessoas fazem tatuagem para homenagear alguém e também porque acham esteticamente bonito.
Marcos Prata
Tsunami
Isaías Sena Chagas fez sua primeira tatuagem há 12 anos porque achava bonito seus traços, a perfeição do desenho, o profissionalismo envolvido e a moldura. Quando era criança, ele sempre achou interessante os detalhes dos desenhos impressos numa tatuagem, e, ao se tornar adulto, decidiu finalmente fazer sua primeira marca no corpo, já que a tatuagem, para ele, é algo que fica registrado por boa parte da vida de uma pessoa. Tsunami disse ainda que uma tatuagem é feita para mostrar, para propagar algo ou um sentimento. A tatuagem reflete atitude, um gosto pessoal, e é uma forma de reproduzir a natureza. A tatuagem, para Tsunami, revela um pouco do caráter e personalidade de cada um.
A segunda tatuagem que Tsunami tem no corpo, no seu braço direito, é um pentagrama. Esse foi o desenho que mais provocou-lhe dor. O pentagrama é um símbolo antigo, pagão e místico, que remota à ascensão do cristianismo. Os adoradores do pentagrama eram considerados, depois da Inquisição, adoradores do demônio. Mas Tsunami esclarece que, na verdade, o pentagrama representa os quatro elementos principais da natureza: água, terra, fogo e ar. As pessoas que não tinham conhecimentos cristãos adoravam os elementos da natureza que regiam a espécie, a matéria humana. Quatro pontas da estrela do pentagrama simbolizam quatro elementos da natureza, enquanto a quinta representa o espírito. O pensamento místico reza que o pentagrama foi adorado por inúmeras civilizações. Assim que a Igreja tomou forma e assumiu o comando da fé, passou a simplesmente eliminar, a queimar em fogueiras, as pessoas que adoravam símbolos como o pentagrama. A própria Igreja costumava inverter o pentagrama e queimar seus adoradores junto com os próprios símbolos. O pentagrama é, pois, o símbolo pagão mais considerado (o pentagrama é o símbolo da maçonaria, e ainda hoje é comum encontrar a estrela de cinco pontas em diversas variedades de lojas do comércio local, assim como em presépios e ornamentações do natal).
No quarto desenho que fez em seu corpo, Tsunami tatuou nas costa o nome satanás. Tsunami disse que não tatuou uma imagem porque, fazer isso, seria reproduzir uma criação mitológica, uma invenção de um ser que ninguém nunca viu. Ele diz que a imagem do diabo com chifre e capa foi o ser humano que criou, uma forma física de uma coisa terrível. Isaías explica que o nome Satanás vem do hebraico. Sat significa senhor; anás significa águas. Satanás portanto seria o Senhor das Águas ou o senhor dos elementos que cria a vida.
Fotos: Alan Cleiton/Eduardo Bastos
Agradecimentos: Alan Cleiton, Rodrigo Bomfim, Marcos Raimundo Prata de Carvalho (Papinho), Isaías Sena Chagas (Tsunami).
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