terça-feira, 13 de outubro de 2015

Grupo Escolar Silvio Romero: Um grito de Socorro

Prédio que pertence ao estado segue abandonado e invisível aos olhos do poder público.


Eduardo Bastos


Durante alguns anos de nossa adolescência residimos numa casa localizada na Rua Acrísio Garcez, atrás do Grupo Escolar Silvio Romero. À época, nesse prédio funcionava uma repartição pública, e isso garantia o bom estado de conservação do espaço. Exatamente nesse período estudávamos o ginasial no Colégio Nossa Senhora da Piedade. Sempre que retornávamos da aula matutina era comum um ou outro irmão deixar o material didático sob meus cuidados para escalar o muro desse Grupo. Não havia qualquer perigo naquele gesto, pois, àquela hora, os funcionários que labutavam por ali já tinha saído para almoçar, e o muro que ladeia a lateral e o fundo do prédio é tão largo e regular, que as caminhadas ao longo dele jamais se constituíam em desafios à lei da gravidade. Nos finais de semana e feriados a garotada do entorno costumava pular o muro desse prédio para usar todo seu espaço externo como cenário das brincadeiras de esconde-esconde e bangue-bangue (nesse tempo era comum meninos e meninas invadirem as ruas a qualquer hora do dia ou da noite para brincarem sem o menor receio de se tornarem vítimas da violência urbana).
Os registro historiográficos disponíveis nos esclarece que o Grupo Silvio Romero teve sua construção iniciada no ano de 1923, e foi o primeiro patrimônio público a receber o nome desse grande pensador lagartense. O governador Gracco Cardoso (1874 –1950) foi quem deliberou que esse Grupo fosse construído em cima dos escombros da antiga cadeia pública da cidade. Em dezembro de 1924 o prédio foi inaugurado. Ao logo dos anos as dependências do Grupo Escolar Silvio Romero serviria como unidade escolar, memorial e biblioteca pública, e até o ano de 2011 ainda permanecia sob a responsabilidade do estado e município.

O professor e historiador lagartense Claudeflanklin Monteiro, citando o estudioso Miguel André Berger, nos esclarece que "o Grupo Escolar Sílvio Romero foi um planejamento para atender não só a uma concepção pedagógica de época, marcada pelo método intuitivo e pelo método analítico de ensino da leitura, mas também para enfatizar a feição monumentalizante da arquitetura de então, haja vista a presença marcante da águia, símbolo do governo Graccho, como um pássaro que enxerga longe e voa alto - pretensões ideológicas e guias daquela profícua administração estadual.

Seu esvaziamento educacional teria ocorrido em função de questões políticas. Os governos que se sucederam a Graccho, em especial até a primeira metade da década de 50, eram adeptos do getulismo, e como de praxe, tentaram apagar a memória das ações administrativas de seus inimigos políticos. Dos anos 60 aos anos 80, especialmente com a construção da nova sede do Grupo Sílvio Romero (mais moderno e mais amplo), na Av. Francisco Gracez (hoje Escola Estadual Sílvio Romero), o prédio foi de tudo um pouco: de local para aprendizagem de cursos de secretariado e de corte e costura a repartição pública (tanto estaduais como municipais)." 

Por praticamente toda a década de 90 o Grupo Escolar Silvio Romero mergulho num estado de total abandono, e se transformou num ponto de usuários de drogas e mendigos. No início do ano de 1999, esse prédio passou por uma grande reforma e o secretário estadual de educação da época, Luiz Antônio Barreto o entregou aos lagartenses dia 20 de abril novinho em folha. Nesse momento, esse espaço passou a abrigar o Memorial e a Biblioteca Pública do nosso município. No início de 2010, voltou à baila o discurso de que a primeira escola pública implantada em Lagarto teria que desocupar esse prédio, face à necessidade de ele passar por nova reforma, que corrigisse principalmente problemas relacionados a infiltrações. Nesse instante, outras vozes se levantaram, contrárias ao funcionamento da Biblioteca e Memorial nesse local, sob a alegação que o prédio não oferecia acessibilidade a pessoas com dificuldade de locomoção, cadeirantes e idosos.

A retirada da Biblioteca e do Memorial do Grupo Escolar Silvio Romero nos início do segundo semestre de 2010 fez com que a existência desse prédio passasse a ser ignorado por todos os entes responsáveis pela manutenção e preservação do patrimônio público. O mato então cresceu e tomou conta de cada canto desse lugar. O lixo e as folhas - que caem sem parar das árvores frondosas que o fronteia - se acumulam por todos os espaços. Portas e janelas, desgastadas pela ação inclemente da chuva e do sol, já não representam obstáculos aos que costumam invadir o prédio onde outrora filhos ilustre de nossa cidade iniciaram suas instruções. Caminhos de papelões foram construídos por entre o matagal para que os usuários de crack e de outros entorpecente transitem dos muros ao prédio do Grupo Silvio Romero sem qualquer obstáculo. A porta principal desse prédio quase nunca se fecha, talvez porque os viciados que costumam habitar ocasionalmente o Grupo Silvio Romero contam com a certeza de que ocupam território neutro, relegado ao esquecimento para todo e sempre.

Nos contatos que tivemos com pessoas que foram ou que ainda são ligadas a órgãos públicos do nosso município, nos foi dito que em meados da década de 1990 esse prédio passou dois anos sem o seu telhado, exposto às intempéries da natureza. Pessoas que trabalham na região nos informaram que dias atrás a prefeitura realizou intervenção no prédio, removendo parte do telhado e o substituindo temporariamente por uma lona. Nos foi dito ainda que o processo de tombamento desse prédio chegou a ser iniciado, mas que ainda não foi concluído. Membros da Secretaria de Cultura do município esclareceram que já se encaminhou projeto à Secretaria Estadual de Cultura, visando reformar e viabilizar a volta do funcionamento desse prédio.

Hoje o estado de conservação do Grupo Escolar Silvio Romero causa indignação àqueles que amam lagarto, pois trata-se de um patrimônio público, localizado no coração da cidade, relegado ao abandono, e provocador de más impressões nas pessoas que nos visitam. Não são poucos os largartenses que costumam expressar no cotidiano a preocupação com a possibilidade real de a qualquer momento esse prédio sofrer um incêndio, uma vez que seu piso é todo em madeira, e haja vista ainda que os usuários de crack e de outras drogas que ocupam esse local costumam usar fósforos, isqueiro e velas durante as práticas de seus vícios. E se um dia as labaredas lamberem esse prédio de forma repentina e incontrolável, restará aos que residem nesse município tão somente lamentar essa perda patrimonial, sob o vislumbre de um cenário de escombros e cinzas.

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